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NOVO CONGRESSO OS MESMOS ERROS (VII e último)

 

 



RESPONSABILIDADE HISTÓRICA 

  

 

Em artigos anteriores fizemos a crítica da linha política do PCP, da sua tática, da violação dos princípios leninistas do centralismo democrático que o camarada Álvaro Cunhal tão bem define em O Partido com paredes de vidro, dos atropelos ao estilo de trabalho que durante décadas vigorou no PCP e em que tantos militantes foram educados. 

 

Dissemos que o PCP atravessava um desvio social-democratizante em tudo contrário ao que deve ser  um partido da classe operária e de todos os trabalhadores, como os seus atuais estatutos ainda o definem. Dissemos que o PCP estava a abandonar o objetivo do socialismo para o nosso país e a substituí-lo por uma “humanização” do capitalismo e que se estava a tornar um partido do sistema capitalista. Avisámos que se ia por muito mau caminho em não dar a resposta necessária às massas, pela luta, para se defender dos ataques cada vez mais fortes do capital. Dissemos que, por isso, o movimento sindical estava a definhar. Criticámos o eleitoralismo e a absolutização na prática da via parlamentar como forma de defender os interesses dos trabalhadores. 

 

Criticámos a aliança com o PS na “nova fase da vida nacional”, a constante desideologização da sua ação política marcada pela banalidade e vulgaridade da ideologia pequeno-burguesa. Alertámos para o perigo da disseminação dessa ideologia junto dos militantes e das massas para todo o futuro do Partido e o destino do povo trabalhador. 

 

Procurámos demonstrar que a perda de influência política e eleitoral junto das massas se devia precisamente a todos estes erros juntos. Criticámos a falta do espírito e da ação do internacionalismo proletário. Chamámos a atenção para o alinhamento do PCP com os setores mais oportunistas do movimento comunista internacional e para a sua inimizade contra o seu núcleo mais consequente. 

 

A duas semanas da realização do XXII Congresso somos confrontados com as declarações do secretário-geral do PCP numa entrevista à Lusa. Vamos partir do princípio que o jornal Expresso e demais comunicação social fazem a transcrição correta do que foi dito. 

 

Tais palavras vêm mostrar afinal quais são as intenções da direção do PCP. Afinal tudo era coerente com o objetivo de fazer voltar a entrar pela porta grande os chamados “renovadores”. 

 

A luta de classes existe também dentro o Partido no plano ideológico e organizativo. Não somos meninos da catequese. Os “renovadores” tinham os seus objetivos políticos e não fizeram uma autocrítica das suas posições. O que mudou foi a atitude da direção face a eles. O secretário-geral apela ao seu regresso com as respetivas cabeças e seu conteúdo, a saber, os objetivos sociais-democratas com os quais ajudarão o PCP a “ir para a frente” - não interessa para onde. 

 

Parece que tudo se encaixa. Os “renovadores” queriam uma aliança com o PS. Ela concretizou-se naquilo a que o PCP chamou, vincando a importância que lhe conferia, a “nova fase da vida nacional”. Essa aliança respira por todos os poros, ou está nas entrelinhas se quisermos, a “política patriótica e de esquerda”. O chamamento dos “renovadores” vai precisamente na linha de procurar aliados para essa política. 

 

Os “renovadores” queriam um capitalismo “reformado”, bonzinho para os trabalhadores. Lá está ele na tática e na estratégia do PCP constantes do seu Programa e reafirmado no projeto de resolução política. O abandono do objetivo do socialismo ressuma da “democracia avançada”. O abandono da linha de massas está no parlamentarismo, no eleitoralismo, na falta de capacidade de encabeçar lutas em que os trabalhadores se revejam e reproduzam o nível de descontentamento em que se encontram. A via da revolução socialista desapareceu de toda a intervenção político-ideológica do PCP, tal como há muito ambicionavam os “renovadores”. 

 

Para um capitalismo humanizado não é necessário um partido de vanguarda. Lá está a queda a pique da organização, o desprezo pela organização e os militantes. Lá está o abandono do centralismo democrático e o florescimento do centralismo burocrático e autoritário. Os “renovadores” achavam que devia ser a pequena-burguesia intelectual a dirigir o partido, e todos os restantes serviam para colar cartazes, cumprir “metas” e fazer papel de adereço nos comícios e iniciativas, para encher salas. Lá está a pequena-burguesia à frente do partido mas sem cultura suficiente para ser considerada “intelectual”. 

 

Os “renovadores” diziam que o PCP tinha de mudar o discurso para cativar mais apoio, para ser mais moderno, para ultrapassar a visão antiquada da luta de classes (com isso querendo dizer abandonar o marxismo-leninismo e o socialismo) e lá está Paulo Raimundo a prometer encontrar as formulações e as formas de não contribuir para aumentar as perceções erradas sobre o PCP, como se   a simpatia ou o ódio pelo PCP fosse uma questão de “perceção” e não uma questão de classe. 

 

Para aquele capitalismo reformado também não seria necessária nenhuma ideologia marxista-leninista nem a ciência do socialismo. Lá está o domínio generalizado da ideologia pequeno-burguesa de meninos bem comportados que não querem ser alvo do falatório dos vizinhos, as posições sem princípios e envergonhadas sobre matérias que deveriam merecer a clareza e o firme e correto posicionamento dos comunistas sem medo de parecerem mal à “sociedade”: inofensivos para a burguesia, politicamente corretos para a pequena-burguesia, caudatários da hierarquia católica. 

 

Na ocasião da Conferência que deu palco à sua eleição para secretário-geral, Paulo Raimundo fez apelo ao regresso dos “renovadores”. Não se deu a devida importância a tal apelo. Entretanto, vários deles começaram de mansinho a entrar em cena e com bons resultados tal como diz Paulo Raimundo. 

 

O secretário-geral do PCP não quer que se faça a distinção entre “renovador e não renovador”. É caso para dizer que não sabe distinguir uma cafeteira de uma colher de pau. Para quem se recorda, foi muito dura a luta contra os tais “renovadores” que tinham começado o seu trabalho desagregador nos órgãos mais importantes do Partido, como a Comissão Política e o Comité Central. Mas o Comité Central cessante e o Congresso de 2000 tomaram as suas resoluções, secundando as posições propostas pelo anterior CC no sentido da defesa do Partido contra a social-democratização que eles pretendiam. Houve sanções disciplinares, muito poucas, que foram desde a expulsão à suspensão por largos meses e houve os que se esconderam. 

 

Não estavam em jogo questões menores, nem muito menos questões pessoais como vem dizer agora Paulo Raimundo, desvalorizando o oportunismo, o combate contra ele e violando as anteriores decisões, já que nenhuma discussão interna, nenhum Congresso ou decisão publicitada pelo CC validaram o regresso dos oportunistas nem revogaram as medidas disciplinares. Se o apelo foi feito no geral, então pode ser aceite por todos os que saíram e ainda estão entre o número dos vivos. Mas Paulo Raimundo afirma que  “já se estão a criar movimentos interessantes de gente a aproximar-se” e que tem havido “um bom contributo” não se sabendo quem são os que já estão a aproximar-se nem quais os contributos positivos. A legalidade estatutária é coisa muito leve, muito fresca, muito fluida, somos todos “bons rapazes”. 

 

Afinal, muitos dos que fingiram combater os “renovadores” aparecem agora como defensores do seu regresso dizendo “voltem que estão perdoados”, tendo feito muito caminho nessa direção ao longo dos 24 anos que nos separam do ano 2000 e do XVI Congresso. 

 

Alguém perguntou aos militantes se estavam de acordo que o PCP se tornasse social-democrata? 

Alguém perguntou aos militantes se rejeitavam o socialismo para o nosso país? Alguém perguntou aos militantes se estavam de acordo que o PCP abandonasse o marxismo-leninismo e o centralismo democrático?  Pois é isso que está a acontecer há pelo menos 24 anos, debaixo da retórica adocicada 

da “alternativa patriótica e de esquerda” e da “democracia avançada”. 

 

Com a realização do XVI congresso em 2000 partiu-se do princípio de que a guerra estava ganha. Mas foi apenas uma batalha. Enquanto existir capitalismo a luta contra o oportunismo no movimento comunista nunca está ganha, é necessário travá-la todos os dias. 

 

Em 1991, quando a URSS ruiu minada pela traição de Gorbachov e pelo desvio de direita que começou com Krouschov depois do XX Congresso do PCUS, muitos se perguntaram: mas onde está o Partido? Ao cabo de muita investigação histórica descobriu-se que tinham andado escondidos durante longos anos, sob a capa de indefetíveis comunistas, os dirigentes e os oportunistas que apoiavam o regresso ao capitalismo. 

 

O XXII Congresso do PCP e os seus futuros dirigentes a eleger pelo órgão máximo do Partido assumem uma grande responsabilidade histórica. Cabe-lhes decidir se continuamos por este caminho e vamos parar  ao mesmo sítio onde foram parar o PCF, o PCE, o PCI ou o PCdoB, ou se se faz, depois de profunda autocrítica (o S-G do PCP parece que só assume a autocrítica pela “perceção errada” que gerou com a tomada de posição tomada acerca da guerra na Ucrânia) uma viragem do rumo combatendo e erradicando o claro desvio de direita que o PCP está a atravessar, como aconteceu antes da reorganização de 40-41 e no período  de vigência das resoluções do V Congresso. 

 

O PCP goza ainda de um profundo reconhecimento histórico do povo pelo seu papel no combate ao fascismo e pelo papel que desempenhou no 25 de abril. O PCP era, e orgulhava-se disso, um partido diferente dos outros. Os que se consideram e são verdadeiros comunistas, herdeiros desse passado histórico glorioso, não podem rever-se no atual estado de coisas no Partido. O seu prestígio está a perder-se lentamente e os posicionamentos de hoje não são legado que se deixe aos comunistas do futuro. 

 

Para o bem e para o mal a responsabilidade histórica pelo que vier a sair do XXII Congresso pesará 

nos ombros dos seus delegados e dos seus presentes e futuros dirigentes. 

 

Os trabalhadores e o povo portugueses necessitam de ver de novo diante dos seus olhos o grande ideal que orientou ao longo de um  século e meio a luta do proletariado mundial: a revolução socialista, o fim da exploração do homem pelo homem. Foi esse ideal que deu força à luta na escura noite fascista, no fundo da qual brilhava a chama da URSS e do socialismo. 

 

Diz Lenine em O Imperialismo estádio supremo do capitalismo

 

«O traço distintivo da situação atual é a existência de condições económicas e políticas que não podiam deixar de tornar o oportunismo ainda mais incompatível com os interesses gerais e vitais do movimento operário: o imperialismo embrionário transformou-se no sistema dominante [...]1» 

Com tudo isto se pode legitimamente concluir que o PCP está incapacitado de dirigir a luta do proletariado pela conquista do poder, pela abolição da exploração capitalista. 

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